Romário na marca do pênalti
Leandro Mazzini
Voltemos a fita na memória. Julho de 1994, a chegada do avião da Seleção Brasileira em Brasília após a conquista do Tetracampeonato na Copa da FIFA. Mal o avião concluiu o taxiamento e da janela do comandante desponta a figura de Romário, o craque daquele torneio, segurando com orgulho a bandeira do Brasil. Foi comovente, encantador, momento histórico.
Stop na fita memorial. Os anos que se passaram nos mostraram o que a alma do craque, e que o tempo consolidou: Romário dentro e fora de campo sempre foi um marqueteiro, e assim tornou-se um bom político. E vice-versa, desde que assumiu o mandato na Câmara dos Deputados em Brasília.
Como na Copa de 94, os ‘jogadores’ do tapete do Salão Verde não deram a mínima para ele, desdenharam de seu potencial talento na ‘grande área’ do plenário e, quando acordaram, Romário já os driblara e marcara seus gols como fazia em campo. Surgiu em momentos oportunos para ‘chutar’ para a Mesa seus projetos e da Tribuna comemorar com a plateia – e por que não torcida.
Contrariando todos os prognósticos dos descrentes, Romário tornou-se um deputado exemplar, muito diferente do perfil e da vida de farras antes do mandato. Foi assíduo em plenário e ativo nas comissões das quais participou, debateu, cobrou, e destacou-se pelos projetos de apoio aos deficientes físicos e de fiscalização dos clubes de futebol.
Não por acaso, foi eleito senador pelo Rio de Janeiro e enterrou a pretensão de Sérgio Cabral de voltar à Casa Alta. E se o leitor ainda está incrédulo daí da arquibancada, assistindo a tudo, prepare-se para conhecer em breve – em meses ou ano – a grande jogada. Romário é candidato ao Governo do Rio, e, se eleito, será candidato a presidente da República. Sim, ele entra na grande área devagar e vai cavar seu pênalti, como fazia com maestria no futebol.
E com chances, independentemente de futuras conjunturas. Tudo depende de sua atuação, porque os cenários conspiram a seu favor. É plausível, pelo seu notório perfil de campeão, marrento e gozador, Romário soltar hoje um ‘Aí Deus apontou o dedo pra mim e falou: tu vai ser presidente!’. Inimaginável – ou, espera-se tamanha indignação de eleitores – se a frase sair de Aécio Neves, Lula, Marina Silva ou outro qualquer potencial presidenciável. Se Romário fala, a galera vibra, ironiza, bate palma (e leva a sério). Para qualquer outro político pretensioso como ele, a vaia.
Antes de qualquer tentativa que o leve a eventual candidatura nacional, não será surpresa Romário se candidatar à Prefeitura do Rio ano que vem. Já citou isso para amigos e aliados. É outro ponto a favor: estrela em ascensão no PSB, com apoio incondicional da executiva nacional do partido e a certeza de um mandato no Senado de oito anos, não tem nada a perder, só a eleição.
E isso faz parte do jogo. Perde ganhando, como num campeonato de pontos. Mesmo que saia das urnas derrotado, dá um ‘empate’ no projeto político. Ele garante a vitrine por meses na capital e um bom recall de votos para uma futura candidatura à reeleição ou ao governo do Rio de Janeiro.
Romário candidato ou presidente não é exagero. A literatura política mundial já nos revelou nomes outrora inimagináveis concretizados nas cadeiras de mandatários. Foi assim com Ronald Reagan, o ator de filmes de segunda categoria dos Estados Unidos que chegou à Casa Branca. Arnold Schwarzenegger foi eleito governador da Califórnia, e só não foi candidato a presidente por bloqueio dos próprios republicanos – e pela má fama de, casado, revelar ser pai do filho na empregada doméstica.
Eleitores não perdoam traidores assim (Aqui também ‘pulada de cerca’ pega mal, te cuida, Romário). E se toda uma horda de políticos, entre aliados e adversários, não tivesse barrado a pretensão do apresentador Silvio Santos na década de 90, provavelmente ele teria passado a faixa de presidente da República para Fernando Henrique Cardoso.
Pão e circo compõem o espetáculo da política desde que mundo é mundo, e somados a futebol, com um personagem vitorioso e polêmico, podem render um bom show.