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O Outono Tupiniquim, e a provável volta do povo às ruas
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Leandro Mazzini

povo

Foto: ABr

Eu tinha 14 anos quando corri em 1989 atrás do candidato Fernando Collor de Mello na minha terra natal, em Minas. Era extraordinário ver de perto aquele homem que só aparecia na televisão com promessas de caçar os marajás e ‘tirar esse bandido que está aí no Poder’.

Lembro bem de sua fala naquele comício de meio de tarde, de meio de semana, e que arrastou meia cidade atrás dele numa caminhada entre o campo de futebol – onde descera espetacularmente de helicóptero – até o Centro. (O vice apagado, Itamar Franco, foi encontrado incólume por um anônimo perdido numa rua, não aguentara o pique, e foi ovacionado por uma dupla).

Também fui às ruas dois anos depois, não pintei o rosto, mas o coração sonhador estava machucado, a alma manchada de vergonha de ter acreditado naquele circo. Assim são os jovens – e adultos ou anciãos, também novos de espírito – que foram às ruas no fim de Junho de 2013, o nosso Outono Tupiniquim, a versão mais comedida da Primavera Árabe.

Não houve queda de governos – ora, vivemos uma democracia madura, apesar de um Poder nem sempre sensato – mas reconheci o meu lado adolescente desencantado de 89 na garotada (não os baderneiros) nas capitais e rincões do ano passado.

O que acontece hoje, e continuará ocorrendo nestes novos tempos, com menos ou mais intensidades, esporadicamente ou não, é o renascer contínuo do ser político intrínseco em nossa alma, o despertar do ‘monstro’ que uiva, do ser humano que solta o grito contido de decepção com tudo e com todos. Isso é bom, e necessário para o aperfeiçoamento da democracia. E o constante, esperamos, melhoramento dos serviços públicos, os quais pagamos com nosso suor cotidiano.

O Outono Tupiniquim remete a um livro recente do pensador francês Stephane Hessel. Ele, que presenciou as marchas de 1968 em Paris, sentiu na Primavera Árabe, de dois anos atrás, o renascer destas almas que dormitaram por muitos anos. Por algum motivo, a internet talvez como fonte propulsora, o povo despertou e se uniu nas ruas. O resultado, nós todos vimos, apesar de neste mundo nada ser perfeito: caíram déspostas decanos, mas o pior deles ficou: o ditador da Síria, Bashar Al Assad.

Pouco antes de morrer, o economista Celso Furtado, em sua última entrevista, foi profético ao dizer que um governo de esquerda no Brasil não teria muita margem de manobra. Pois Lula conseguiu chegar lá, mas pouco mudou o que tanto criticara. Em alguns casos, o PT fez pior. Pouco antes de falecer, o vice-presidente José Alencar, então presidente interino num café ao crepúsculo com este repórter, confidenciou baixinho: ‘O maior problema do Brasil é a impunidade’.

O recado das ruas é apartidário, mas para todos os partidos. As coisas mudam, pessoas idem, sonhos se esfacelam, no entanto outros nascem de formas diferentes, como estes nas ruas. Há possibilidade de esses jovens – de idade e de espírito – que dormitam desde Julho, acordarem no pré-carnaval motivados pelo novo (e inevitável, agora) aumento das passagens de ônibus municipais, por lei, em todo o país. Desta vez, não há negociação – a inflação está aí, a gasolina aumentou e ano passado os prefeitos já bancaram o subsídio.

Provavelmente um novo mutirão de gritos nas ruas de todos os cantos não seja movido pela contestação das passagens. A turma já pulou a roleta. O povo agora mostrou a cara, tem identidade, tirou a carteira e quer é conduzir o ônibus..

Em tempo, o ‘bandido’ ao qual o candidato Collor se referiu era José Sarney, então presidente, hoje seu colega de bons papos e sorrisos no Senado Federal.

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